
UM TANGO PERIGOSO
Por Paulo Brossard*
A presidente da Argentina, faz algum tempo, anda às testilhas com os meios de comunicação de seu país. E o contencioso se acentuou depois da reeleição da senhora Cristina Kirchner. Basta dizer que seu governo encaminhou ao Congresso projeto de lei, aprovado, colocando de joelhos a vigorosa imprensa rio-platense, pois fica na dependência do humor governamental. Aliás, o expediente não é novo, ao tempo de Perón as grandes folhas portenhas tiveram de jejuar à espera de papel, entre outras medidas. La Prensa, que era como La Nación, um dos mais completos jornais de seu tempo, parece não ter resistido ao bloqueio sofrido. O fato é que a Câmara aprovou o projeto de lei e o Senado acaba de confirmar o voto da Câmara. A sanção presidencial é fora de dúvida. E, com a estatização da única empresa argentina a fabricar papel específico para imprensa, será difícil supor que o expediente tenha por objetivo assegurar a liberdade de imprensa, mas obviamente, seu amordaçamento.
Dois ou três dias antes da aprovação congressual do projeto de lei, de origem do Executivo, ser aprovado pela Câmara e Senado, como ficou dito, fato novo veio a suceder, em circunstâncias inacreditáveis, mas que servem para retratar as entranhas do processo, processo nada compatível com os princípios e praxes democráticos. Algo semelhante já ocorrera na Venezuela e na Bolívia, países que não chegam a ser padrões de democracia. Pois, agora, a Argentina vai se juntar a eles, divorciando-se da gloriosa contribuição de figuras consulares de sua história, como Rivadavia, Sarmiento, Mitre, Saenz Peña e de sua tradição cultural, bastando lembrar que o argentino Bernardo Houssay, salvo engano, foi o único sul-americano a receber o Prêmio Nobel de Medicina. Com efeito, a polícia militar argentina invadiu e ocupou por três horas a sede da operadora de TV a cabo Cablevisión, em Buenos Aires; trata-se de uma subsidiária do Grupo Clarín, o maior complexo de comunicação daquele país; a operação fora autorizada por um juiz com jurisdição na Província de Mendoza, com base em denúncia do Grupo Villa Manzano, aliados do governo e concorrentes do Clarín; os invasores se apossaram do que quiseram da empresa portenha. Dispenso-me de arrolar outros dados, ainda que relevantes, porque basta o exposto para retratar a enormidade da violência e ilicitude praticadas em plena capital da nação, que só encontra paralelo em fases tenebrosas e de insegurança que, desse modo, induz que a marca daqueles tempos esteja sendo restabelecida no país vizinho.
Com efeito, a repercussão mundial do fato está a indicar sua excepcional gravidade. Para que fosse mais refinada a violência, o juiz que a autorizou é da Província de Mendoza, e sua consumação se deu na capital federal! Na história argentina, houve períodos extremamente contraditórios. No século 19, foram os tempos de Rosas, no século 20 a tormentosa fase do peronismo, e para documentar que este ainda não passou, está começando ou continuando no século 21, evidência de que a selvageria não se extinguiu nas bandas do Rio da Prata.
E isto é ruim para toda a América, dada a importância da Argentina sob todas as luzes, tudo o que lá acontece de bom ou de mau se reflete no continente. A violência e a ofensa a normas históricas da civilização ocidental a que pertencemos, Argentina e Brasil, nunca deu bom resultado nem para a grande nação do Prata.
Jornal Zero Hora
26/12/2011
*Paulo Brossard de Souza Pinto (Bagé, 23 de outubro de 1924) é um advogado, jurista, professor e político brasileiro.
Formado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 1947 e lá também obteve o título de especialista em Direito Civil e Direito Constitucional em 1952. Antes de optar pela política ministrou aulas na Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Defensor convicto do parlamentarismo,foi eleito deputado estadual pelo PL em 1954, 1958 e 1962.Após o Golpe Militar de 1964 filiou-se ao MDB e foi eleito deputado federal em 1966. Candidato a senador em 1970 foi preterido em favor de Daniel Krieger e Tarso Dutra, candidatos da ARENA. Derrotado nas urnas retornou ao magistério e à advocacia em Porto Alegre.
Eleito senador em 1974 foi primeiro vice-presidente nacional do MDB (1975-1979) e em 1978 foi candidato a vice-presidente da República na chapa do General Euler Bentes Monteiro sendo derrotados no Colégio Eleitoral pelo General João Figueiredo e por Aureliano Chaves então candidatos da ARENA por 355 votos a 266.[2] A seguir foi líder da bancada no Senado (1978-1980) posto que manteve quando da criação do PMDB. Em 1982 foi derrotado por Carlos Chiarelli (PDS) ao tentar a reeleição.
Escolhido consultor-geral da República pelo presidente José Sarney foi posteriormente nomeado Ministro da Justiça até deixar o cargo em virtude de sua escolha para ministro do Supremo Tribunal Federal em 1989 o que lhe valeu um assento no Tribunal Superior Eleitoral corte da qual foi eleito presidente em 1992 e nessa condição comandou a realização do plebiscito sobre a forma e o sistema de governo do Brasil em 21 de abril do ano seguinte conforme previa a Constituição de 1988. Aposentou-se do Supremo Tribunal Federal em 1994.
Posted by Mário Rozano
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